O cristianismo da banheira quente é radicalmente errado. Por quê? Porque expressa tanto o egocentrismo, pelo qual um indivíduo recusa negar a si próprio, como também o eudemonismo, pelo qual a pessoa rejeita o programa disciplinar de Deus para si mesmo. Assim, torna-se duplamente irreligioso.
Por egocentrismo, refiro-me à essência da imagem de Satanás na humanidade decaída. Isto pode ser descrito como a relutância em se enxergar como existindo para o prazer do Criador e, ao contrário, a disposição de se estabelecer como centro de todas as coisas. A busca pelo prazer próprio em qualquer uma de suas modalidades é a regra e a força motriz da vida egocêntrica. Orgulho é o nome cristão clássico para esta síndrome de auto-afirmação e auto-adoração, da qual o moto implícito é "seja feita minha vontade". Embora o orgulho egocêntrico possa adotar a forma de Cristianismo, corrompe a substância e o espírito do Cristianismo. Tenta manipular Deus e controlá-lo para seus próprios objetivos. Isso, como já indicado, reduz a religião à mágica, tratando o Deus que nos fez como se ele fosse o nosso mordomo pessoal ou o gênio da lâmpada de nosso Aladim.
O teocentrismo — que repudia o egocentrismo, reconhecendo que, no sentido fundamental, nós existimos para Deus e não ele para nós, e então adorando-o convenientemente — é básico para a verdadeira piedade. Sem esta mudança radical, da centralização em si próprio para a centralização em Deus, qualquer mostra de religião é falsa em maior ou menor grau.
Jesus Cristo exige abnegação, isto é, autonegação (Mt 16.24; Mc 8.34; Lc 9.23) como uma condição necessária do discipulado. A abnegação é um chamado para a pessoa se submeter à autoridade de Deus como Pai, e de Jesus Cristo como Senhor, e para declarar guerra vitalícia contra o egoísmo instintivo. A negação requerida é do eu carnal, do impulso egocêntrico, auto-deificante com o qual nascemos, e que nos domina tão ruinosamente em nosso estado natural.
Jesus une a negação de si ao levar a cruz. Levar a cruz é muito mais do que suportar esta ou aquela aflição. Carregar sua cruz nos dias de Jesus, como aprendemos da própria história da crucificação de Jesus, era requerido daqueles a quem a sociedade havia condenado, cujos direitos haviam sido suspensos, e que agora estavam sendo conduzidos para sua execução. A cruz que carregavam era o instrumento da morte. Jesus representa o discipulado como sendo uma questão de segui-lo, e segui-lo tomando sua cruz em negação de si mesmo. O ser carnal nunca consentiria em lançar-se em tal papel. "Quando Cristo chama um homem, propõe que ele venha e morra", escreveu Dietrich Bonhoeffer, oito anos antes dos nazistas o terem enforcado. Bonhoeffer estava certo: aceitar morrer para tudo aquilo que o ser carnal quer possuir é justamente o assunto do apelo de Cristo.
O cristianismo da banheira quente deixa de encarar essa questão e tenta aproveitar o poder de Deus vinculando-o às prioridades da auto-centralização. Sentimentos de prazer e de conforto, brotando de circunstâncias agradáveis e experiências suaves, são objetivos importantes hoje em dia, e muito do Cristianismo popular dos dois lados do Atlântico tenta fazer a nossa vontade, fabricando-os para nós. Algumas vezes, como meio para alcançar esse fim, invoca a idéia de que as promessas de Deus são como os encantos de um mágico: use-as corretamente e você poderá extrair de Deus qualquer coisa legítima e agradável que deseje. Quando eu era estudante, fiquei chocado com um pequeno livro de sermões de um conhecido evangelista, Como Escrever Seu Próprio Cheque com Deus.
Hoje, quarenta anos mais tarde, o assim chamado "evangelho da saúde e prosperidade", que promete cura miraculosa para os enfermos e enriquecimento material para os necessitados, desde que eles ajam ousadamente sobre a fórmula "afirme e reivindique", tem muitos e fascinados seguidores. Muitos não são devotos totais da "cura-e-prosperidade", mas ainda tratam Tiago 5.15 ("A oração da fé salvará o enfermo") como fórmula mágica garantida para cura milagrosa, sempre que a "fé" for alcançada. Quando falo da religião da banheira quente, tenho em mente posições tais como esta.
É correto e bom ter confiança nos recursos ilimitados de Deus e altas expectativas de ser liberto do mal. Mas, conceber uma oração de petição como sendo uma técnica para fazer Deus "dançar segundo a música" que você estabelece e obedecer às ordens que você dá não é certo nem bom. Na oração de petição, devemos tentar discernir o propósito de Deus na vida ou na situação de vida que colocamos perante ele, e cristalizar pedidos específicos como uma demonstração de "Seja feita a tua vontade", que deve ser sempre nossa súplica fundamental. A religião da banheira quente não alcança o ponto onde pode ver isto. O egocentrismo que a produziu é devastador; a oração como maneira nossa de gerenciar e dirigir as energias de Deus, de tal maneira que ele nos reconheça, em vez de nós a ele, nunca está longe de seu coração. É mau!
J. I. Packer
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